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JAPORÃ: Os desafios da cidade com 57% da população indígena


Cacique nasceu na Aldeia Porto Lindo e está no segundo mandato. (Kisie Ainõa/Jornal Midiamax) Por: Soares Filho | 21/08/2023 17:10

Em uma série especial, o Jornal eletrônico Midiamax foi ao município aqui da região Conesul para conhecer os desafios da coidade que concentra a maior população indígena de Mato Grosso do Sul em relação a não indígena.

Ao todo, são 4.170 indígenas, o que representa 57,81% da população. De um pequeno lugarejo, fundado em meados de 1953 por famílias do interior paulista interessadas no domínio de terras, a cidade foi crescendo por meio da agricultura e também margeada pelo Rio Iguatemi. Em meio à natureza, estão os indígenas, que lutam diariamente para preservar sua cultura e sobreviver ao "mundo moderno".

Atento às demandas da população, o cacique da aldeia Porto Lindo, Roberto Carlos, de 42 anos, diz que muitos são os desafios enfrentados pela população indígena residente no município.

Com 1,3 mil famílias, o que equivale a cerca de seis mil indígenas, diz que o número do IBGE pode ser ainda maior e equipara a aldeia a uma cidade, porém, lamenta a falta de estrutura e até mesmo “abandono do poder público”, fazendo muitos moradores perderem a esperança na vida e se envolverem no vício das drogas e bebidas alcoólicas, por exemplo.

“Pela minha experiência, posso dizer que nós, indígenas, carregamos uma cicatriz de 1.523 anos na nossa vida. Hoje, sentimos que é muito difícil ser índio e, com isso, carregamos uma tristeza profunda de 1.523 anos. A gente é discriminado, maltratado, ameaçado e isolado. Só que também falo que somos valentes demais, principalmente porque tem índio que ultrapassa toda essa barreira e vai estudar”, afirmou o cacique.

Conforme o cacique, após luta conjunta da própria aldeia e o executivo municipal, parte dos indígenas estão empregados. “Destes 6 mil, 250 são funcionários públicos, cerca de 300 estão no  Frango Bello, 90 no frigorífico de Iguatemi, 30 em uma empresa fabricante de sapatos, 23 prestando serviço na Teston, que é de plantio de cana-de-açúcar e mais 10 parentes indígenas no frigorífico de Naviraí”, explicou.

Aldeia gera empregos em meio ao desemprego

Guaranis, terenas e kaiowás trabalhando: ainda conforme o cacique, não há discriminação de raça entre os “irmãos indígenas e os irmãos brancos”, os quais recebem muitas oportunidades na aldeia.

“Aqui todo mundo trabalha. Tem os brancos também, que fazem pinturas, construções e perfuram poços. A gente gera muito emprego aqui, com instalações de tecnologia, por exemplo. Não há preconceito e, quem tem, é porque não conhece a história e nem se conhece”, lamentou o cacique.

 

De acordo com Roberto Carlos, a história é clara quando diz que os portugueses descobriram o Brasil, em um grupo só de homens, tendo as mulheres indígenas como companheiras.

“Quem estava aqui de mulher para reproduzir? E muitos falam: a minha avó foi pega no laço, minha mãe, vó, bisavó, era indígena, ou seja, a geração brasileira é indígena. A mãe brasileira é indígena. Só o pai é estrangeiro. Somos gerações de fruto indígena, então, sempre digo que as pessoas precisam se autoconhecer. Quem sou eu? Vou estudar um pouco a história da minha mãe. Onde que nasceu, que brotou, aí vão chegar aqui, nos indígenas”, argumentou.

Refúgio a preconceito: álcool e drogas na aldeia

Por conta da falta de conhecimento, muitos discriminam, não oferecem oportunidades e é por isso que parte dos indígenas buscam refúgio em vícios. “Infelizmente, a droga chegou aqui na aldeia também. E como o preconceito, o índio sempre é visto como alcoólatra, drogado, vagabundo, só que aqui, 90% da população são agricultores, sabem trabalhar, só não tem oportunidade”, garantiu.

 

Até pouco tempo, segundo o cacique, a entrada da aldeia estampava uma placa, onde dizia: "Proibida a entrada de pessoas estranhas". "Ou seja, proibiam a entrada de quem queria e poderia vir nos ajudar. Aqui nós morremos de fome, de doenças, ninguém vem nos ajudar e quem está do lado de fora fala que isso é tudo é a nossa cultura, só para não nos ajudar, então, é por isso também que temos casos de uso de drogas, alcoolismo e suicídio. Estamos tristes, vendendo almoço para comprar a janta e, muitos índios valentes, foram estudar, buscar conhecimento e retornam para ajudar e fazer o serviço formiguinha, então, hoje, o que pensamos é que muitos não veem futuro na vida", finalizou.

Graziela Rezende (Midiamax)



Endereço: Alameda dos Tuiuiús, 57 Naviraí-MS